O Living Wage como estratégia de Gestão de Riscos
08 agosto 2025
O conceito de “salário digno” tem ganho cada vez mais destaque nos debates sobre justiça social e condições de trabalho, especialmente na Europa. Mas o que é, de facto, um salário digno? Segundo o artigo 23.º da Declaração Universal dos Direitos Humanos, “toda a pessoa que trabalha tem direito a uma remuneração justa que assegure uma existência digna”.
O salário digno é a remuneração necessária para que um indivíduo mantenha um padrão de vida adequado, incluindo o básico: alimentação, habitação, educação, saúde, transporte e vestuário. Ao contrário do salário mínimo, que muitas vezes é insuficiente, o salário digno garante um rendimento adequado para viver com dignidade.
É importante destacar que o conceito de living wage tende a ser definido por região, variando conforme o custo de vida local. Isto pode significar que o que é considerado um salário digno numa determinada cidade pode ser diferente noutra, refletindo as particularidades e necessidades de cada região.
Estudos da Mercer indicam que a implementação do conceito de living wage traz benefícios significativos tanto para os colaboradores como para as organizações. Um salário digno não só melhora a qualidade de vida, como também reduz a pressão financeira de muitas famílias, possibilitando a diminuição da dependência de assistência social. Além disso, proporciona segurança financeira e acesso a serviços essenciais, resultando numa maior satisfação laboral.
Colaboradores com uma perceção positiva da sua remuneração tendem a ser mais leais e responsáveis, o que reduz a rotatividade e os custos associados à contratação de novos profissionais. Para as organizações, isto pode traduzir-se numa maior produtividade e numa imagem mais positiva enquanto marca empregadora, além de constituir uma vantagem competitiva no mercado, atraindo, por exemplo, consumidores que valorizam a ética e a responsabilidade social.
A implementação do living wage está alinhada com os princípios do Pilar Europeu de Direitos Sociais, que defende salários justos e adequados, promovendo a inclusão e a equidade. Num contexto em que as organizações enfrentam riscos, como a insatisfação dos colaboradores e a elevada rotatividade, oferecer salários alinhados com o conceito de living wage pode melhorar a satisfação e criar um ambiente de trabalho mais estável.
De acordo com o estudo “A Visão das Empresas Portuguesas sobre os Riscos 2024” da Marsh Portugal, 62% das empresas consideram a falta de qualificação um risco importante. Investir em salários dignos pode, de facto, ter um impacto positivo na atração de talentos e na motivação do desenvolvimento dos colaboradores.
Para ter visibilidade sobre qual o valor adequado a considerar como living wage, as organizações podem realizar uma análise mais geral (high level) com foco em indicadores de custo de vida nas localizações onde operam (quick scan), ou uma análise detalhada (“deep dive”) que contempla também a inclusão de fatores como a composição do agregado familiar e a inflação. Realizar estas análises periodicamente permite às organizações uma visão atualizada do living wage adequado, tendo também em conta a evolução do mercado.
Apesar dos benefícios, a implementação do conceito de living wage enfrenta desafios. Quando as organizações aumentam os salários para garantir que todos os colaboradores recebam um salário digno, poderão estar a incorrer em despesas mais elevadas, especialmente em setores com margens de lucro reduzidas e com bases operacionais muito alargadas.
Além disso, poderão existir preocupações sobre a possibilidade de perda de postos de trabalho. Algumas organizações temem que, ao aumentar os salários, possam não conseguir manter todos os seus colaboradores, especialmente se não conseguirem aumentar a sua produtividade ou se a concorrência não seguir o mesmo caminho.
No entanto, considera-se que, a longo prazo, os benefícios superam os custos, na medida em que colaboradores satisfeitos com a sua remuneração e com a organização tendem a ser mais produtivos e comprometidos.
É importante notar que, em Portugal, têm surgido movimentos em diversos setores, nomeadamente no do retalho, que refletem uma tendência salarial mais alinhada com as necessidades dos colaboradores.
Senior Compensation Consultant da Mercer Portugal